PRECEDENTES:
O que são?
Pode parecer simples definir precedentes judiciais, mas
acredite não é tão simples, existem coisas mais complexas.
Didier assim conceitua:
“Em sentido lato, o precedente é a decisão judicial tomada à
luz de um caso concreto, cujo elemento normativo pode servir como diretriz para
o julgamento de casos análogos.”[1]
Para Marinoni
“O precedente é a primeira
decisão que elabora a tese jurídica ou é a decisão que definitivamente a
delineia, deixando-a cristalina.”[2]
Embora, trouxemos o conceito dado por dois do maiores
processualistas do nosso tempo, isso é pouco para se entender o precedente
judicial.
Por que?
Porque, me desculpem a analogia horrível, um precedente
judicial é feito de casca, clara e gema. Sendo a gema o núcleo, a ratio
decidendi, como conceituam os
processualistas, a razão de decidir, esta tem força persuasiva. Já iremos
tratar disso com a devida atenção.
Podemos dizer que as circunstâncias de fato, aquele objeto de
discussão no processo, o que realmente aconteceu na vida e foi levado ao
judiciário, esta é a clara, que pode servir de analogia para comparação de
casos posteriores, assim como se usa a clara e a gema de um ovo para fazer uma
omelete, mas lembre-se a ratio decidendi,
esta sim é que tem força.
Bom o que resta em um ovo, a casca, e o que seria esta casca?
Seria a argumentação jurídica, a fala rebuscada, o embelezamento do julgado, esta
casca ela não tem relevância ou influi na gema, ou seja, no julgado. A ela os
juristas dão o n nome de Obliter dictum.
Estranhou o nome?
Então se acostume, porque no estudo dos precedentes
judiciais iremos abordar nomes que fogem
ao estudo cotidiano do processo, expressões na maioria das vezes inglesas, pois
os precedentes embora, agora tenham a atenção do nosso processo, sua origem vem
de países de common law, lá eles são fonte do direito.
Lembra quando você
esta na faculdade e no estudo de qualquer matéria, quando estamos no
tópico fonte, a primeira que vem é a Lei e nunca vinha descrito jurisprudência?
Pois é este entendimento, vem mudando ao longo dos últimos
anos, ainda mais com a adoção em nosso ordenamento jurídico das súmulas
vinculantes.
Mas vamos falar, mais da origem dos precedentes.
Nos países anglo-saxões de cultura common law, os precedentes judiciais são fontes do direito, há
autores que afirma que na Inglaterra, eles são o próprio direito[3].
Para quem não esta lembrando o que é o sistema de common law, que se contrapõe ao nossos
sistema de civil law, vamos esclarecer.
Common law é um
sistema mais utilizado por países de origem anglo-saxônica como Estados Unidos
e Inglaterra. Uma simples diferença é que lá o Direito se baseia mais na
Jurisprudência que no texto da lei.
Civil Law é a estrutura jurídica oficialmente adotada no
Brasil. O que basicamente significa que as principais fontes do Direito
adotadas aqui são a Lei, o texto.
O sistema do Common law, também conhecido como sistema anglo-saxão, distingue-se
do Civil law especialmente em razão das fontes do Direito. Como dito, no Civil
law o ordenamento consubstancia-se principalmente em leis, abrangendo os atos
normativos em geral, como decretos, resoluções, medias provisórias etc. No
sistema anglo-saxão os juízes e tribunais se espelham nos costumes, no que já
foi decidido anteriormente. Esse respeito ao passado é inerente à teoria
declaratória do Direito e é dela que se extrai a ideia de precedente judicial[4]
E por que dar
relevância aos julgados? Assim como ocorre no common law?
Primeiramente convém alertar que nosso ordenamento jurídico
não esta se transformando em um sistema common law, a fonte primária de nosso
regramento é a Lei em sentindo amplo, inclua-se a Constituição, leis
ordinárias, Medidas Provisórias.
Ocorre que, a lei em si é insuficiente para abarcar todas as
questões que podem vir a acontecer, são infinitos os casos concretos e a lei é
restrita, por isso, o legislador tem adotado cada vez mais, conceitos jurídicos
indeterminados e clausulas abertas, assim a obediência a precedentes vem para
trazer segurança para esta crise de insuficiência da lei.
Diga-se de passagem que o sistema common law, também passa por sua crise, devido ao fato de que a
sociedade esta se transformando e mudanças
profundas e rápidas somente podem ser efetuadas através da lei.
Assim os dois sistemas tem se aproximado nos últimos anos,
eles adotando mais as leis e nós observando a devida importância dos julgados,
a adoção de sumulas vinculantes e o novo CPC vem demonstrar isso.
Tal aproximação não é recente, pois o CPC de 1939, em seu
art. 861 trazia expressamente que o Tribunal poderia promover o pronunciamento
prévio sobre a interpretação de qualquer norma jurídica.
Desta maneira, estamos hoje diante de uma realidade
inafastável a dos precedentes judiciais, ou stare
decidis, mais um nome para gravar para o seu concurso, ou precedentes
obrigatórios.
O que vem a ser o
precedente?
Já tivemos
oportunidade de falar dos três elementos que compõe o precedente judicial, a ratio
decidendi, os elementos fáticos e o Obliter Dictum.
Agora vamos nos ater somente a ratio decidendi. Como definir o que seja ratio decidendi. O professor
Marcelo Alves[5]
nos traz a resposta.
a)
a regra de direito explicitamente estabelecida pelo juiz como base de sua
decisão, isto é, a resposta explícita a questão de direito do caso; b) a razão
explicitamente dada pelo juiz para decisão, isto é, a justificação explícita
para a resposta dada a questão do caso; c) a regra de direito implícita nas
razões do juiz para justificação de sua decisão, isto é, a resposta implícita a
questão de direito do caso.
Lembra quando fizemos a analogia do ovo, a ratio
decidendi, ela foi utilizada naquele caso concreto, tal como uma gema é
usada em um bolo, mas como toda gema pode ser utilizada em outros bolos, ou em
outras receitas semelhantes.
Então, resumindo, para que se compreenda, quando uma
determinada decisão é tomada em um caso concreto, e as razões e fundamentos
jurídicos que a determinaram são tão relevantes a ponto de serem aplicados a
outros casos semelhantes, estamos diante de um precedente.
Marinoni diz, que tudo em uma sentença é importante para
aplicação e compreensão do precedente, desde o dispositivo e a fundamentação
até o relatório[6].
Qual o melhor método
para se identificar o precedente?
Do sistema do common
law, emergiram três teorias:
Teoria de Wambaugh, Teoria de Oliphant e a Teoria de
Goodhart.
A
primeira, considerada como clássica, afirma que a ratio decidendi de um caso é
a proposição ou regra sem a qual o caso seria decidido de forma diversa e
propõe um teste, de acordo com o qual se deve alterar o conteúdo da premissa
para verificar se a decisão se mantém ou não a mesma. Assim, se a decisão
sofrer mudança, a premissa era realmente necessária e se constituía ratio
decidendi; por outro lado, se a decisão permanecesse inalterada, a premissa era
mero obiter dictum (SOUZA, 2011).
A
de Oliphant, rejeita a busca da ratio decidendi no raciocínio do juiz para
chegar a decisão, pois entende que a opinião do tribunal é uma racionalização
preparada depois da decisão que dá boas razões, mas não, as razões reais.
Assim, sugere que os fatos levados ao tribunal sejam considerados como
estímulos a uma resposta. No seu entendimento, a combinação dos estímulos e a
resposta são a ratio decidendi, que é a decisão real do caso (SOUZA, 2011).
Já
a Teoria de Goodhart consiste, essencialmente, na determinação da ratio de um
precedente mediante a consideração: a) dos fatos tidos como fundamentais, na
ótica do juiz do precedente, e, b) da decisão do juiz baseada nesses fatos. A
fundamentação disso está no fato de que, no julgamento de um caso, o direito é
analisado pelo juiz ou por qualquer outro intérprete, levando em consideração
os fatos do caso, e restando, por conseguinte, que o peso das proposições
afirmadas pelo julgador com base nos fatos fundamentais é sempre maior do que o
peso de qualquer outra coisa que o juiz afirme (SOUZA, 2011).
DIDIER diz que o melhor método é palicar conjuntamente os
métodos de Wambaugh e Goodhart
Qual a diferença entre
precedente, súmula e jurisprudência?
Didier mais uma vez nos brinda com uma resposta:
Um
precedente, quando reiteradamente aplicado, se transforma em jurisprudência,
que, se predominar em Tribunal, pode dar ensejo à edição de súmula da jurisprudência
deste Tribunal.
Assim,
a súmula é o enunciado normativo (texto) da ratio decidendi, (norma geral) de uma jurisprudência
dominante,que é a reiteração de um precddnete.
Há
pois, uma evolução: precedente – jurisprudência – súmula[7].
A súmula é a concretização
textual e sintética do precedente.
Qual
a razão para se aplicar o precedente?
Bom primeiramente convém exemplificar:
Vamos supor que você e seu vizinho foram lesados pelo Estado,
devido a um acidente cometido por um funcionário público, ocorre que, seu
vizinho procurou o judiciário para ser ressarcido pelo dano material e
compensado pelo dano moral, você preferiu esquecer, porque achou que aquilo
iria demorar muito e não traria resultados práticos.
Ocorre que, em pouco tempo o juiz que viu o caso do seu
vizinho deu uma sentença favorável com base em um entendimento do STJ e seu
vizinho foi recompensado e ressarcido.
Opa, perai, se ele conseguiu eu também posso, não é o que
você pensa de imediato? O meu caso é o mesmo, meu vizinho ganhou uma bolada
considerável então é melhor eu procurar os meus direitos, é o estes o pensamento de todo mundo.
Ai você contrata seu advogado, ingressa com a ação e o
resultado, improcedência.
O que acontece com você? Fica p... Correto? Xinga todo mundo,
diz que o juiz é corrupto, que seu vizinho tem treta com ele, se sente
injustiçado e é por isso que os precedentes são aplicados.
Para não se causar injustiça em casos semelhantes, não trazer
insegurança.
Além disso, o princípio da igualdade deve ser invocado,
afinal, você queria que o Estado te tratasse de uma forma igual a do seu
vizinho.
Para além das partes, temos o dever de coerência, o sistema
deve ter uma coerência, foge da razoabilidade, decisões que permite o
jurisdicionado entender que o sistema não funciona de forma coerente.
Ao se observar um precedente, o sistema observa o princípio
da integridade.
Todos os precedentes
te força obrigatória ou vinculante?
Art.
927. Os juízes e os tribunais
observarão:
I - as
decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de
constitucionalidade;
II - os
enunciados de súmula vinculante;
III - os
acórdãos em incidente de assunção de competência[8] ou de resolução de
demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial
repetitivos;
IV - os
enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e
do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a
orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1o Os
juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10[9] e no art. 489[10], § 1o, quando decidirem
com fundamento neste artigo.
§ 2o A
alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de
casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação
de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da
tese.
§ 3o Na
hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e
dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos,
pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da
segurança jurídica.
§ 4o A
modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese
adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de
fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança
jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5o Os
tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão
jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de
computadores.
Bom vamos a analise dos incisos, antes convém esclarecer que
o artigo 927 trouxe um ordem hierárquica, porém não exaustiva de precedentes
judiciais e a palavra “ obedecerão” deixa claro que sua aplicação é
obrigatória, claro que há exceções que veremos posteriormente.
O STF é o guardião da Constituição, conforme mandamento
constitucional, cabe a ele, o controle de constitucionalidade em abstrato e
concentrado das normas que contrariam a Constituição e toda decisão em ADI e
ADECON tem efeitos vinculantes para os demais órgãos jurisdicionais e para o
Poder Executivo.
Quanto as súmulas vinculantes, iremos tratar delas em
separado na próxima aula, como continuidade da aula de precedentes.
Quanto ao inciso III o motivo de sua inclusão é relevante,
pois como os precedentes, visam dar coerência e segurança ao ordenamento, os acórdãos
em incidente de assunção de competência
ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos
extraordinário e especial repetitivos, demonstram a importância desses
julgados, evitando uma proliferação de recursos descabidos.
Os outros dois incisos não tem muito o que se falar, pois são
autoexplicativos.
Previsão no novo cpc.
Art. 926:
“Os
tribunais devem uniformizar a sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e
coerente”
CAPÍTULO
XV
DO
PRECEDENTE JUDICIAL
Art. 520
Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável.
Parágrafo
único. Na forma e segundo as condições fixadas no regimento interno, os
tribunais devem editar enunciados correspondentes à súmula da jurisprudência
dominante.
Art.521
Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da legalidade, da
segurança jurídica, da duração razoável do processo, da proteção da confiança e
da isonomia, as disposições seguintes devem ser observadas:
I – os
juízes e os tribunais seguirão a súmula vinculante, os acórdãos em incidente de
assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento
de recursos extraordinário e especial repetitivos;
II – os
juízes e os tribunais seguirão os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal
Federal em matéria constitucional, do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional e dos tribunais aos quais estiverem vinculados, nesta
ordem;
III – não
havendo enunciado de súmula da jurisprudência dominante, os juízes e os
tribunais seguirão os precedentes: Aqui esta a importância de
se ler os informativos do STF E STJ.
a) do
plenário do Supremo Tribunal Federal, em matéria constitucional;
b) da
Corte Especial ou das Seções do Superior Tribunal de Justiça, nesta ordem, em
matéria infraconstitucional;
IV – não
havendo precedente do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de
Justiça, os juízes e os órgãos fracionários do Tribunal de Justiça ou do
Tribunal Regional Federal seguirão os precedentes do plenário ou do órgão
especial respectivo, nesta ordem;
V – os
juízes e os órgãos fracionários do Tribunal de Justiça seguirão, em matéria de
direito local, os precedentes do plenário ou do órgão especial respectivo,
nesta ordem.
§1º Na
hipótese de alteração da sua jurisprudência dominante, sumulada ou não, ou de
seu precedente, os tribunais podem modular os efeitos da decisão que supera o
entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lhe atribuindo efeitos
prospectivos.
§2º A
mudança de entendimento sedimentado, que tenha ou não sido sumulado, observará
a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os
princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§3º Nas
hipóteses dos incisos II a V do caput deste artigo, a mudança de entendimento
sedimentado poderá realizar-se incidentalmente, no processo de julgamento de
recurso ou de causa de competência originária do tribunal, observado, sempre, o
disposto no §1º deste artigo.
§4º O
efeito previsto nos incisos do caput deste artigo decorre dos fundamentos
determinantes adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento
tenha ou não sido sumulado.
§5º Não
possuem o efeito previsto nos incisos do caput deste artigo:
I – os
fundamentos, ainda que presentes no acórdão, que não forem imprescindíveis para
que se alcance o resultado fixado em seu dispositivo;obliter
dictum.
II – os
fundamentos, ainda que relevantes e contidos no acórdão, que não tiverem sido
adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão julgador.
§6º O
precedente ou a jurisprudência dotado do efeito previsto nos incisos do caput
deste artigo pode não ser seguido, quando o órgão jurisdicional distinguir o
caso sob julgamento, demonstrando, mediante argumentação racional e
justificativa convincente, tratar-se de caso particularizado por situação
fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor outra solução
jurídica.
§7o Os
tribunais deverão dar publicidade aos seus precedentes, organizando-os por
questão jurídica decidida e divulgando-os preferencialmente por meio da rede
mundial de computadores.
Art. 522
Para os fins deste Código, considera-se julgamento de casos repetitivos:
I – o do
incidente de resolução de demandas repetitivas;
II – o
dos recursos especial e extraordinário repetitivos.
TÉCNICAS
DE APLICAÇÃO E SUPERAÇÃO DE PRECEDENTES
Lá vamos nós a mais nomes complicados, mas se o estudante
prestar a devida atenção a eles poderá ver a sua aplicação.
O juiz ele não aplica os precedentes de forma desarrazoada e
descabida, não, ele na verdade faz uma atividade de interpretação e
confrontação.
Pega-se os fundamentos jurídicos utilizados em outra decisão
paradigma, da qual o precedente foi criado e então sob a lupa do contraditório,
da coerência e da igualdade ele verifica se o caso sob judice, realmente merece a aplicação do precedente, tanto que
ele pode afastá-lo, ou demonstrar que o precedentes esta superado.
Conforme já esclarecido, só há sentido falar em precedente
vinculante, quando a ratio decidendi do mesmo puder ser aplicada a casos
análogos posteriores.
A técnica de confronto e diferenciação entre os fatos
relevantes de dois casos dá-se o nome de distinguishing.
Ela revela a inadequação da aplicação da ratio decidendi do
precedente ao caso em julgamento, em virtude da diversidade fática entre os
mesmos. Assim dá flexibilidade ao sistema não o engessando e faz justiça no
caso concreto (ATAÍDE JUNIOR, 2012).
Se não houver coincidência entre os fatos
discutidos na demanda e a tese jurídica que subsidiou o precedente, ou, ainda,
se houver alguma peculiaridade no caso que afaste a aplicação da ratio
decidendi daquele precedente, o magistrado poderá se ater a hipótese sub judice
sem se vincular ao julgamento anterior.
Como se pode perceber, apesar da noção de
obrigatoriedade, os precedentes não devem ser invocados em toda e qualquer
situação. Há muitos casos em que os fatos não guardam relação de semelhança,
mas exigem a mesma conclusão jurídica. Noutros, os fatos podem até guardar
similitude, mas as particularidades de cada caso os tornam substancialmente
diferentes.[11]
DIDIER[12]
acrescenta que ainda se pode dar uma aplicação restritiva do precedente (restrictive distinguishing) ou uma
aplicação ampliativa (ampliative
dsitinguish).
O CPC 2015 foi muito enfático quanto ao distinguish, tanto que esta técnica requer
uma fundamentação coerente, caso contrário estaremos diante de uma sentença
imotivada, como já se viu nas aulas de motivação das decisões judiciais
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela
interlocutória, sentença ou acórdão, que:
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente
invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em
julgamento ou a superação do entendimento.
Para além do caso de não aplicação do precedente, temos a
técnica de superação do precedente, a mais conhecida é o overruling.
O overruling é uma
forma de superação, ou seja, revogação de precedentes que ocorre tanto no plano
horizontal (órgão revoga seu próprio precedente) como também no plano vertical
(tribunal superior revogando um precedente de um inferior hierárquico). Os
requisitos básicos para a revogação de um precedente são a perda de congruência
social e o surgimento de inconsistência sistêmica.[13]
Segundo Fredie Didier, “overruling
é a técnica através da qual um precedente perde a sua força vinculante e é
substituído (overruled) por outro
precedente[14]”.
A não motivação do overruling
é caso de sentença imotivada, como se extrai do artigo 489 § 1º inciso VI.
O autor nos diz ainda que ele poder expresso (express overruling) nestes caso o
Tribunal resolver, expressamente abandonar a concepção anterior e adotar uma
nova, ou tácito (implied overruling) não há substituição expressa.
Há a perda da congruência social quando um
precedente passa a negar proposições morais, políticas e de experiência. As
proposições morais determinam uma conduta como certa e errada a partir do
consenso geral da comunidade, as políticas caracterizam uma situação como boa
ou má em face do bem-estar geral e as de experiência dizem respeito ao modo
como o mundo funciona.[15]
TECHNIQUE OF SINALING, TRANSFORMATION E OVERRIDING
Com
a técnica da sinalização (technique of
sinaling) o tribunal não ignora que o conteúdo do precedente está
equivocado ou não mais deve ser observado, porém, por razões de segurança
jurídica, ao invés de revogá-lo, prefere apontar para sua perda de consistência
e sinalizar para a sua futura revogação[16].
Na transformation,
embora o resultado a que se chega no caso em julgamento seja incompatível com a
ratio decidendi do precedente, tenta-se compatibilizar a solução do caso com o
precedente transformado ou reconstruído, mediante a atribuição de relevância
aos fatos que foram considerados de passagem[17].
Embora se conclua pelo erro da tese (razão determinante) do
precedente, admite-se que se chegou a resultado correto, porém através de
fundamento equivocado[18].
Através do overriding a Corte limita
ou restringe a incidência do precedente, como se fosse uma revogação parcial.
Porém, o overriding mais se aproxima do distinghishing do que de uma revogação
parcial, pois, apesar do resultado do caso em julgamento ser incompatível com a
totalidade do precedente, a restrição se dá com fulcro em situação relevante
que não estava envolvida no precedente (MARINONI, 2012).
Essas técnicas são empregadas em países
do sistema common law, principalmente nos Estados Unidos. No Brasil, pode-se
exemplificar o overriding com a interpretação que o Supremo Tribunal Federal
(STF) deu ao enunciado 343 de sua súmula que estabelece que “Não cabe ação
rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda
se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”.
Após a edição de tal enunciado, o STF interpretou-o de modo a restringir seu
alcance, por entender que não seria aplicável quando a alegada violação fosse a
dispositivo da Constituição (ATAÍDE JUNIOR, 2012).
Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode
ser rescindida quando:
III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento
da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de
fraudar a lei;
VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em
processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado,
prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si
só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
§ 1o Há
erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando
considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em
ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o
juiz deveria ter se pronunciado.
§ 2o Nas
hipóteses previstas nos incisos do caput,
será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de
mérito, impeça:
§ 4o Os
atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros
participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos
homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos
termos da lei.
§ 5º Cabe
ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão
baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos
repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão
discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento. (Incluído
pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
§ 6º Quando
a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob
pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação
particularizada por hipótese fática distinta ou de questão jurídica não
examinada, a impor outra solução jurídica. (Incluído
pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
[1]
DIDIER, Fredie, Curso de Direito Processual Civil, volume 2, editora Juspodivm,
p. 441
[2] MARINONI,
Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo:
RT, 2006, v. 1, p. 99.
[3] MACHADO DE CARVALHO Felipe Quintella, Os precedentes judiciais
como fonte do Direito: a lição do direito anglo-saxão, disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5903#_ftn2
[4] Donizetti,
Elpídio A Força dos Precedentes do Novo Código de Processo Civil, disponível
em: http://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/155178268/a-forca-dos-precedentes-do-novo-codigo-de-processo-civil
[5] SOUZA,
Marcelo Alves Dias de. Do precedente judicial à súmula vinculante. 1.ed. (ano
2006), 5. reimp. Curitiba: Juruá, 2011.
[6]
MARINONI, Luiz Guilherme, Precedentes Obrigatórios. 2ª edição, 2011, p. 221.
[7]
DIDIER, obra citada, p. 487.
[8]
Art. 947. É admissível a assunção de competência quando o julgamento de
recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária
envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem
repetição em múltiplos processos.
§ 1º Ocorrendo a hipótese
de assunção de competência, o relator proporá, de ofício ou a requerimento da
parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, que seja o recurso, a
remessa necessária ou o processo de competência originária julgado pelo órgão
colegiado que o regimento indicar.
§ 2º O órgão colegiado
julgará o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária
se reconhecer interesse público na assunção de competência.
§ 3º O acórdão proferido em
assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários, exceto
se houver revisão de tese.
§ 4º Aplica-se o disposto
neste artigo quando ocorrer relevante questão de direito a respeito da qual
seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou
turmas do tribunal.
[9] Art.
10. O juiz não pode decidir, em grau
algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha
dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria
sobre a qual deva decidir de ofício.
[10]
Art. 489. São elementos essenciais da
sentença:
I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a
identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das
principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II - os fundamentos, em que o juiz analisará as
questões de fato e de direito;
III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as
questões principais que as partes lhe submeterem.
§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão
judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à
paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão
decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem
explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar
qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no
processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de
súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o
caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula,
jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência
de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
§ 2o No caso de colisão entre normas, o juiz deve
justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as
razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas
que fundamentam a conclusão.
§ 3o A decisão judicial deve ser interpretada a partir
da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da
boa-fé
[11]
DONIZETE. Elpidio, artigo já citado.
[12]
DIDIER, obra citada, p. 493.
[13] ATAÍDE
JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues de. Precedentes vinculantes e irretroatividade do
direito no sistema processual brasileiro: os precedentes dos tribunais
superiores e sua eficácia temporal. Curitiba: Juruá, 2012.
[14]
DIDIER, obra citada, p. 494.
[15] MARINONI,
Luiz Guilherme. Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e de
common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil. Revista da
Faculdade de Direito da UFPR. Curitiba, n. 49, p. 11-58, 2009.
[16] MARINONI,
Luiz Guilherme. Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e de
common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil. Revista da
Faculdade de Direito da UFPR. Curitiba, n. 49, p. 11-58, 2009.
[17] ATAÍDE
JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues de. Precedentes vinculantes e irretroatividade do
direito no sistema processual brasileiro: os precedentes dos tribunais
superiores e sua eficácia temporal. Curitiba: Juruá, 2012.
[18] ATAÍDE
JÚNIOR, Jaldemiro Rodrigues de. Precedentes vinculantes e irretroatividade do
direito no sistema processual brasileiro: os precedentes dos tribunais
superiores e sua eficácia temporal. Curitiba: Juruá, 2012.
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